CRACOLÂNDIA
A terra do vício
A atuação do catolicismo sem decaídas
Assim como a Cristolandia, há outros projetos destinados à recuperação de usuários de drogas. A Comunidade Casa Esperança e Vida (CCEV), fundada pelo Irmão Bernardo, do Mosteiro Esperança, que trabalha há 48 anos com dependentes químicos, é um exemplo.
O projeto, com 38 anos de existência, teve início com um grupo de alcoólatras anônimos e só depois, é que foram incluídos grupos destinados a dependentes químicos com base na experiência desenvolvida.
Irmão Bernardo acredita que o motivo que faz as pessoas irem atrás das drogas tem origem ainda no útero materno.
“[...]a rejeição pela mãe ou algum problema de falta de recursos que ela teria para cuidar da criança pode vir a cortar o sentido da vida desse feto. É um trauma que vai acompanhá-lo e que poderá ocasionar uma dependência, pois se no ventre não houve uma autodestruição - como, por exemplo, o feto se enrolar no cordão umbilical -, depois de nascer, a pessoa irá passar a vida inteira tentando se autodestruir. E ela fará isso entrando no mundo das drogas”.
O padre afirma que, no método utilizado no tratamento que oferece aos dependentes, nunca houve caso de crise de abstinência.
Nenhuma medicação é utilizada durante os nove meses do procedimento - não por acaso, equivalente ao tempo de uma gestação. Os usuários não são cobrados financeiramente e nem obrigados a permanecer na comunidade para realizar o tratamento, feito por livre e espontânea vontade e com foco na espiritualidade.
Sem nenhuma ajuda do governo, a CCEV é mantida por doações de empresas e de pessoas.
“Já tentamos algumas vezes parceria com o governo, só que, para você fazer esse tipo de parceria, você tem que fazer de conta, como eles fazem. Você precisa aceitar as regras do jogo que eles te dão e todas essas regras são mentirosas... Não há interesse na cura de ninguém. É só para fazer figura e contar número. Então, se é para mentir junto com o governo, nós não queremos".
A viagem ao mundo das drogas pode iniciar de várias maneiras. O sobrevivente da vez é Francisco Marcelo Rissan, de 49 anos.
Francisco iniciou no mundo das drogas
aos 19 anos. Começou pela maconha, passou
pela cocaína e, por último, veio o crack.
“Eu me envolvi por curiosidade. Não tive
nenhum problema familiar, financeiro ou
qualquer doença psicológica”. Ele explica
que conheceu a maconha e a cocaína por
curiosidade, já o crack foi uma consequência.
“Eu achava que não iria acontecer nada comigo.
Que eu usaria a droga, mas que não ficaria
viciado", complementa.
De acordo com as irmãs de Francisco,
Adélia Rissan, de 61 anos, e Cinira Rissan,
de 54,a família descobriu seu envolvimento
com as drogas quando perceberam que ele
saía de casa e não voltava, passando a
noite inteira fora. Começaram a desconfiar,
até que encontraram pedras de crack no ralo
do banheiro da casa onde moravam.
“Ficou por muitos anos assim, até que a gente
ofereceu novamente ajuda, e ele aceitou.
Ele foi para umas três clínicas. Ele reclamava do local, dizia que era maltratado, e daí a gente trocava. Até que conhecemos a CCEV. Ele começou a frequentar os cultos e as reuniões que aconteciam no mosteiro por oito meses, concluindo dessa vez o tratamento”, comenta Adélia.
As irmãs contam que o tratamento funcionava por meio da leitura da bília, com foco na desintoxicação e com trabalho de reinserção social. Foi participando desse trabalho que Francisco, agora padre, afastou-se dos amigos de vício e resolveu trilhar um novo caminho, o da Igreja.
“Depois que eu saí do mosteiro, na fase final da reinserção, eu conheci um pessoal que falava de missões. Eu não sabia o que era e me inscrevi para um curso, no qual fui aceito. Virei um missionário, e meu trabalho é pregar que Cristo é a única salvação para todas as pessoas".
Padre Francisco, que até hoje mantém o vínculo com a CCEV, está limpo há 18 anos.